Ao enveredar
pelas linhas a seguir, alguns leitores, tomando ciência de quem as escreve,
talvez se vejam envolvidos por brumas de incredulidade e hesitem prosseguir:
afinal, por que um romancista estaria introduzindo uma coletânea dedicada a
contos? De fato, não é pequena a parcela do público que enxerga a literatura
através de um postigo exíguo e mesquinho, segregando contos de romances, e
nutre um preconceito que por vezes beira a superstição.
Confesso: durante
muito tempo, enclausurado na masmorra dos romancistas radicais, integrei essa
estirpe de espíritos débeis e viciosos, que viam contos com olhos glaciais. Mas
a boa ventura entrelaçou meu destino aos de exímios contistas de uma incipiente
safra nacional, e percebi extasiado: toda forma de literatura resplandece sob o
mesmo sol. Mais que isso. Entendi que o contista é um ser notável, pois, na
ação de suas histórias, ele está adstrito a universos reduzidos — já que a
narrativa nesse estilo literário costuma ater-se a um único fragmento
existencial dos personagens, a um único drama em especial, a um único momento
definido no tempo — limitação só vencida por uma pena criativa, capaz de
conferir um lirismo (igualmente único) às palavras, de elevar a simplicidade a
dimensões inimagináveis, de conceder auras oníricas a situações cotidianas e de
fazer do clímax dramático um instante intenso e mágico, tudo com o objetivo de
arrebatar o leitor de maneira singular, o que remete à célebre e arguta frase
do contista argentino Julio Cortázar: “No combate entre um texto e seu leitor,
o romance sempre vence por pontos, enquanto o conto deve vencer por nocaute.”
A despeito de
todas as qualidades inerentes aos contos e dos prazeres proporcionados por esse
estilo narrativo, promovê-los em um projeto demanda coragem e abnegação. O
fomentador precisa superar a barreira do gosto popular por histórias longas e apresentar
um produto atraente ao público — como dito acima, que o nocauteie. Entre esses
heróis criativos, temos uma maranhense dada a “letripulias” — como ela própria
define sua postura literária — que, apesar de formada nas áreas de Ciência da
Computação e Romanística, é autora e editora de EBooks gratuitos e
independentes, blogueira voltada às Letras e mentora do projeto 15 Contos +,
cujo segundo volume estou tendo a felicidade de introduzir.
Tal qual um
gemólogo encantado ao se deparar com o potencial de diamantes inlapidados, li,
feliz, os textos auspiciosos deste volume em seu estado original, sem revisões
ou alterações. Assim como uma pedra precisa ser bela, rara e durável para ser
considerada uma gema, um texto, além de possuir certos atributos para ser
qualificado como conto, também necessita de certas qualidades para ser
precioso. E elas estão presentes nas linhas criadas pelos autores desta
coletânea, pois Helena selecionou escritos promissores — poéticos, criativos e
repletos de imagens vívidas — para integrá-la. O leitor que se aventurar neste
volume certamente se deparará com diversos estilos de contar um conto, mas
jamais deixará de se deleitar.
As palavras na
história de um contista exímio são cheias de significados especiais, cujo
enunciado nem sempre se extrai em um primeiro momento (coisa da verdadeira
arte), e demandam leitores sensíveis, que queiram e saibam degustá-las na
essência. Espero que você, que acompanhou até o final esta introdução, seja um
desses seres abençoados.
Sergio Carmach, 29 de julho de 2013.
SERGIO CARMACH é
escritor — autor do livro Para Sempre Ana (Editora Caravansarai, 2011),
indicado para concorrer na categoria “melhor romance” do Prêmio Literário Codex
de Ouro 2013 — videomaker e advogado (sergiocarmach.blogspot.com).
Copyright 2013 (c) - Todos os direitos reservados ao autor. Esta obra é parte da coletânea 15 Contos+ Volume II, Helena Frenzel Ed. e está licenciada sob uma Licença Creative Commons 2.5 Brasil. Você pode copiar, distribuir, exibir, executar, desde que seja dado crédito ao autor original. Você não pode fazer uso comercial desta obra. Você não pode criar obras derivadas.
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